NÃO CONFUNDA A PREGAÇÃO COM O ENSINO
É importante observar, em princípio, que uma mesma pessoa pode receber de Deus o ministério de pregador e o de ensinador. Comecemos a nossa abordagem por Jesus Cristo, Pregador por excelência e Mestre de quinta-essência. Em Mateus 4.23 está escrito que Ele percorria a Galileia “ensinando nas suas sinagogas, e pregando o evangelho do Reino, e curando todas as enfermidades e moléstias entre o povo”.
O Deus-Homem tinha, na terra, um ministério tripartido: ensinava, pregava e curava. Um estudo cuidadoso dos Evangelhos apontará que dois terços do ministério terreno de Jesus foi voltado para o ensino e a pregação do Evangelho. E, em Mateus, curiosamente, o verbo “ensinar” sempre vem primeiro em lugar, quando mencionado ao lado do verbo “pregar” (cf. 9.35; 11.1, etc.). Isso sugere que o Senhor priorizava o ensino.
Em Atos dos Apóstolos vemos que os primeiros ministros escolhidos pelo Senhor, “todos os dias, no templo e nas casas, não cessavam de ensinar e de anunciar a Jesus Cristo” (5.42). Aqui, o verbo “ensinar” denota “doutrinar”, o que engloba, evidentemente, conteúdo e técnica. Isso significa que ensinar é mais difícil que pregar? Não, necessariamente. Pregar também tem as suas características peculiares, mencionadas, especialmente, em 1 Coríntios 2.1-5 e 1 Tessalonicenses 1.5: o conteúdo, isto é, a sã doutrina (gr. logos); a certeza gerada pela unção do Espírito Santo sobre o pregador (gr. pathos); e o caráter percebido do pregador (gr. ethos).
Vejamos agora a diferença entre a pregação e o ensino na vida de Paulo. Este, aliás, à semelhança do Senhor Jesus, também recebeu do Senhor um ministério tríplice: “Para o que (digo a verdade em Cristo, não minto) fui constituído pregador, e apóstolo, e doutor dos gentios, na fé e na verdade” (1 Tm 2.7). Esse apóstolo tanto pregava o Evangelho quanto ensinava as Escrituras, haja vista ter sido um pregador e um doutor chamado pelo Senhor (cf. 2 Tm 1.11).
Na sua Primeira Epístola a Timóteo, o apóstolo Paulo, ao fazer menção do trabalho dos presbíteros, afirmou: “Os presbíteros que governam bem sejam estimados por dignos de duplicada honra, principalmente os que trabalham na palavra e na doutrina” (5.17). Um leitor desatento poderá pensar que Paulo foi redundante ao empregar os termos “palavra” e “doutrina”. Mas esses termos, em grego, aludem à pregação e ao ensino, ao predicar e ao enseñar, como consta da versão castelhana Reina-Valera. No inglês, na English Standard Version (ESV), foram empregados os substantivos preaching (pregação) e teaching (ensino).
Há, portanto, diferença entre a pregação e o ensino. A primeira é mais incisiva e persuasiva; apela para uma reflexão profunda e urgente, seguida de uma tomada de posição imediata. Isso nos faz lembrar da mensagem de Pedro, no dia de Pentecostes, da exposição de Estêvão, diante dos seus acusadores (At 2; 7). E assim por diante. Já o ensino tem uma dinâmica diferente. Ele é muito mais voltado para a razão. E o ensinador precisa de tempo para explicar; pressa não combina com ensino. Isso nos faz lembrar da explanação de Paulo em Trôade, em que ele “alargou a prática até à meia-noite” (20.7). Em seguida, depois de um intervalo para “partir o pão”, o apóstolo “ainda lhes falou largamente até à alvorada” (v. 11).
Gosto muito da abordagem a partir da Bíblia, mas não poderia concluir este pequeno artigo sem mencionar, pelo menos, duas importantes obras literárias sobre a pregação e o ensino. Quanto à pregação, recomendo o melhor livro sobre o assunto já lido pelo eminente R.C. Sproul: Pregação Cristocêntrica, de Bryan Chapell (Editora Cultura Cristã, 2002). E sobre o ensino recomendo o Manual de Ensino para o Educador Cristão, editado por Kenneth O. Gangel e Howard G. Hendricks (Editora CPAD, 1999). Duas obras simplesmente extraordinárias. Que Deus abençoe a todos os pregadores do Evangelho e ensinadores das Escrituras!
Ciro Sanches Zibordi
Fonte: Disponível em: <http://cirozibordi.blogspot.com.br/2014/11/nao-confunda-pregacao-com-o-ensino.html>, Acesso em 26/11/16.